O livro que eu escrevi foi publicado! O livro pode ser comprado na versão impressa ou na versão digital. Basta clicar no link: visualizar o livro. E, para quem se interessar, aqui está a sinopse:
Charles é um menino de nove anos de idade que, após a morte de seu avô, decide fugir de casa e, principalmente, do pai opressor. Ele sai da pequena cidade do interior para chegar à capital. Ao colocar os pés na grande metrópole, porém, percebe que as coisas não são como ele imaginava. Apesar de contar com a ajuda de Lídia – uma senhora extremamente generosa – e com a amizade de Cindy – uma garota adorável – ele ainda assim precisa passar por muitas dificuldades, e deve vencer cada uma delas se quiser sobreviver na selva de pedra. Misturando drama, humor e principalmente amizade, Viagem à Selva de Pedra mostra, acima de tudo, que a vida, por si só, é muito mais fantástica do que qualquer conto de fadas.
Leite Derramado, de Chico Buarque, trata exatamente do que o título propõe: aquilo que foi não pode ser mudado e, mais importante, não volta nunca mais.
A história é sobre um homem de 100 anos que está numa casa geriátrica. Ele, como um bom velho ranzinza, adora reclamar das coisas, mas acima de tudo, adora contar as histórias de seu passado. A narrativa nos faz sentir um tom extremamente nostálgico, como se nós mesmos tivéssemos vivido aquelas memórias, como se nós quiséssemos profundamente que elas voltassem. Nós sentimos saudades do início do século XX e de tudo o que se seguiu. Nós ficamos tristes com suas perdas - mortes e uma melancólica separação. Matilde, sua esposa, é uma mulher idealizada por Eulálio (o narrador-protagonista), mas depois percebemos que ela não é essa perfeição que ele imaginava. Os capítulos são curtos e não seguem uma ordem cronológica, exatamente como se o próprio Eulálio estivesse, pessoalmente, nos contando seu passado. Velho, é claro que ele não vai narrar tudo com extrema perfeição, cronologia e fidelidade. Há coisas que claramente são enganos, outras são mentiras descaradas, mas há sempre a emoção do homem que no momento não possui nada além de suas memórias. Chico Buarque, consagrado autor de inúmeras músicas geniais, também demonstra todo seu talento para escrever romances. Uma história cativante, divertida e melancólica, sutil e realista. Trata não só do tema principal: memória e envelhecimento, mas também aborda passagens históricas. Abolição da escravidão, Era Vergas, Regime Militar (se tratando de Chico Buarque, essa parte não podia faltar), etc. Leite Derramado: recomendadíssimo a todos os tipos de leitores e leitoras! ;)
UMA BREVE INTERPRETAÇÃO DA MÚSICA
DE CHICO BUARQUE
E
m ACORDA AMOR,
Chico Buarque demonstra como era a vida numa época em que aqueles que prometem
nos proteger são aqueles a quem devemos temer.
"Acorda amor" - 1. Chico pode estar falando
como alguém que, durante a noite, acorda ouvindo barulhos estranhos e suspeita
que sua casa possa estar sendo invadida, e então se vira e chama seu marido/sua
esposa;2. Também faz referência ao
povo, dizendo "Acorda!" para que as pessoas percebessem o que estava
acontecendo bem diante de seus narizes, uma vez que a maioria das pessoas, no
início, não tinha noção do que faziam os ditadores.
"Eu tive um pesadelo
agora" - Tal absurdo (líderes censurando informações, pessoas perdendo por
completo sua liberdade, torturas diárias por parte do governo, etc.) parece ser
coisa tão ruim que só poderia acontecer em um pesadelo.
"Sonhei que tinha gente lá
fora / Batendo no portão, que aflição" - Esses são os militares entrando
nas casas das pessoas, sem pedir licença, acordando-os, raptando-os, e
torturados sob o mínimo sinal de suspeita em relação a algo desaprovado pelo
governo. É o clássico "bater primeiro e perguntar depois".
"Era a dura [...]" -
Chico usa "DURA" na verdade referindo-se à "ditaDURA".
"[...] numa muito escura
viatura / Minha nossa santa criatura" - Aquilo que essas pessoas eram levadas
a crer (que uma viatura é sinal de segurança, pois os policiais estão aqui para
nos proteger [em teoria, pelo menos]) na verdade era o contrário, pois os invasores
eram justamente esses da viatura.
"Chame, chame, chame lá /
Chame, chame o ladrão, chame o ladrão!" - Quando alguém invade sua casa, o
que é comum ser feito? Chamar a polícia, não é? Mas e quando é a própria
polícia que está invadindo, o que se pode fazer? Ora, a única alternativa é
chamar o ladrão. Chame o ladrão!
"Acorda amor, / Não é mais
pesadelo nada" - Aquilo que perecia ser apenas um pesadelo, era realidade,
por mais absurdo que fosse. Acorda povo, pois essa é a realidade!
"Tem gente já no vão da escada
/ Fazendo confusão, que aflição" - 1. Alguns já estavam acordando daquilo
que não era pesadelo e protestando;2.
Os policiais já estavam dominando tudo, chegando perto de você e prontos para
te pegar, e instaurar a confusão, o caos.
"São os homens" -
"homens" significando policiais.
"E
eu aqui parado de pijama" - Apesar de tudo o que estava acontecendo no
Brasil, muitos ainda não faziam nada, apenas ficavam ali parados, de pijama.
"Eu não gosto de passar
vexame" - Eis um dos motivos para que alguém, que já havia
"acordado" e ainda assim não fazia nada: o vexame, que pode ser
tanto:
1. Por parte da sociedade, que desacreditava nos revolucionários
e ainda debochavam; 2. Por parte dos próprios militares, que humilhavam as
pessoas e, como o maior dos vexames, as torturavam e matavam.
"Chame, chame, chame / Chame o
ladrão, chame o ladrão" - Agora se tornara mais seguro ter um ladrão
dentro de casa do que um policial.
"Se eu demorar uns meses,
Convém, às vezes, você sofrer" - Em alguns meses ainda havia a possibilidade
da pessoa, mesmo capturada pelos ditadores, estar viva, ainda que escondida.
"Mas depois de um ano eu não
vindo" - Depois de um tempo, era quase certo que a pessoa havia sido morta.
"Ponha a roupa de domingo" - A roupa de domingo
é a roupa de ir à missa. No caso, a missa de luto, de um ano da morte de um
ente querido.
"E pode me esquecer" - A
história daqueles que eram capturados tornava-se completamente esquecida depois
de um tempo, até por causa da censura de dados, que eram mantidos apenas em
poder dos próprios ditadores.
"Acorda amor / Que o bicho é
brabo e não sossega" – Povo, acorde, pois os ditadores fazem crueldades, e
não vão parar, pelo contrário, continuarão até que as pessoas façam algo a
respeito.
"Se você corre o bicho
pega" - Num contexto onde o "bicho" é o próprio governo, ou
seja, está no controle de tudo, não há para onde fugir, pois eles saberão onde
você está.
"Se fica não sei não /
Atenção" - Embora fugir fosse arriscado, ficar era ainda pior, com certeza.
"Não demora / Dia desses chega
a sua hora / Não discuta à toa não reclame" - 1. Ele pode estar se dirigindo
às pessoas que, mais cedo ou mais tarde, também seriam capturadas, e não
adiantava de nada discutir, pois os militares faziam o que os convinha, sem se
importar com o torturado;2. Ele também
pode estar se dirigindo ao ditador, dizendo "agora você está no poder, mas
em breve será derrubado, e aí não adianta reclamar, pois o povo
prevalecerá", mensagem que ele também passa em sua outra música, Apesar de você.
"Clame, chame lá, chame, chame
/ Chame o ladrão, chame o ladrão, chame o ladrão" - Num país onde as leis
são determinadas por ditadores, aquele que oficialmente é o criminoso, pode, na
verdade, ser o revolucionário, que era perseguido pela polícia, mas isso não significava
que ele era o ruim da história. Chame o ladrão, pois talvez ele seja o único
que está fazendo o bem, e na época não havia como fazer o bem sem desobedecer
às leis ditatoriais.
"Não esqueça a escova, o
sabonete e o violão" - itens básicos (escova e sabonete) acompanhados do
violão (significando a música) que era a maneira que tinham de lutar contra a
ditadura; músicas que continham mensagens subliminares, como a própria ACORDA
AMOR.
“
Aonde é que foi
parar o país de Independência?
Onde está a
ordem e progresso?
Em meio a toda
essa guerra já não sei para onde ir...
Simplesmente me
perdi, em busca de paz e igualdade.
Queria poder ter
voz para dizer, mas a violência me tornou incapaz de falar.
Aqui não há
direitos, só regime militar...
As pessoas são
mudas e não podem contestar,
Sobre as
palavras que aqui estou tentando expressar...
Violência,
guerra, desigualdade, e regime militar...”¹
Na
música, K’naan introduz um narrador no mínimo incomum, pois este não é uma
pessoa, um animal ou um objeto, mas sim um continente inteiro: a África,
contando sua própria história e suas esperanças para o futuro.
“When I get older I will be
stronger” (Quando eu ficar mais velho eu
serei mais forte) – A África, apesar de ser tão grande e tão antiga, ainda
vê-se em fase de amadurecimento, tal qual um jovem, uma vez que seus países só
conquistaram independência recentemente, e a partir daí o continente começou a
andar com as próprias pernas, ainda que com enormes dificuldades, mas a África
ainda anseia pelo dia em que tudo isso passará e ela será forte e poderosa.
“They'll call me freedom, just like
a wavin' flag” (Eles me chamarão de
Liberdade, assim como uma bandeira ao vento) – Apesar da citada independência
oficial, os países africanos continuam presos ao seu passado e presente de
exploração, fome, doença, descaso etc. Mas a esperança é de que algum dia esses
países sejam livres, assim como serão suas bandeiras levantadas com orgulho ao
vento.
“Born to a throne, stronger than
Rome” (Nascido em um trono, mais forte
do que Roma) – A maioria das evidências fósseis aponta para a África como
sendo o lugar onde o ser humano surgiu; o trono onde todos nós nascemos. Não
importa se seus pais vieram da Espanha, se seus avós vieram da Itália ou se
seus bisavós vieram da Índia, sua decendência é africana. Somos todos
afro-descendentes. E não há reino maior do que esse, do que nossa casa, nem
mesmo o grande Império Romano (ou qualquer outro império) pode igualar-se à mãe
África, berço do nosso mundo.
“A violent prone, poor people zone”
(Uma grande violência, zona de pessoas
pobres) – Eis a realidade da África, como todos sabemos: a maior parte de
sua população (principalmente no sul) é extremamente pobre. Tal pobreza faz com
que as pessoas passem fome, não tenham saneamento básico, infraestrutura, saúde
etc. Nesse cenário, é evidente que o índice de violência é muito elevado.
“But it's my home, all I have known
/ Where I got grown, streets we would roam” (Mas é o meu lar, tudo o que já conheci / Onde eu cresci, ruas por onde
passeávamos) – Apesar de todos esses enormes problemas, a África ainda
abriga milhões de pessoas, pessoas que a tem como seu lar, como o único lugar
no mundo que as acolheu, como a única terra onde eles são bem-vindos. O
restente do mundo rejeita e simplesmente “esquece” do continente africano e de
todos os seus habitantes. Sem grandes esperanças, é provável que um africano
nasça, cresça e morra perante a mesma cena de miséria e esquecimento.
“Out of the darkness, I came the
farthest / Among the hardest survival” (Fora
da escuridão, eu vim mais longe / Entre os mais árduos sobreviventes) –
K’naan conseguiu livrar-se da pobreza; saiu da escuridão. Ele foi mais longe do
que a grande maioria dos africanos. Contudo, esse “longe” não é tão distante se
compararmos aos astros americanos que já têm sua fama programada por agentes de
marketing. K’naan não teve facilidades; sua realidade era de profunda
escuridão, da qual poucos conseguem sair e ver a luz.
“Learn from these streets, it can be
bleak / Accept no defeat, surrender, retreat” (Aprender nas ruas pode ser desolador / Não aceitar nenhuma derrota,
renúncia, recuo) – Assim que o povo africano sobrevive: aprendendo com as
dificuldades que o mundo despeja sobre eles. Assim fica infinitamente mais
difícil simplemente não desistir, não abandonar qualquer esperança de vitória.
Mas mesmo com tudo contra eles, ainda há a chance de vencer.
“So we struggling, fighting to eat”
(Assim nós batalhamos, lutando para comer)
– Já não bastasse a falta de apoio financeiro, político e moral que assola a
África, ainda há um problema maior: a fome. Se uma criança consegue jantar, não
sabe se conseguirá almoçar no dia seguinte, assim como seus pais nem seus avós
não sabem. É viver com a incerteza de estar vivo no dia seguinte.
“And we
wondering when we'll be free / So we patiently wait for that fateful day / It's
not far away, but for now we say…” (E nós nos
perguntamos quando seremos livres / Então nós pacientemente esperamos por esse
dia fatídico / Não está muito longe, mas por enquanto nós dizemos...) –
Essa é a esperança que move o povo africano: o dia em um futuro próximo ou
distante em que eles serão finalmente livres, depois de tanta exploração,
escravidão, indiferença e descaso. Um dia, talvez em breve ou talvez em muito
tempo, mas um dia a África será livre.
“When I get older I will be stronger
/ They'll call me freedom just like a wavin' flag” (Quando eu ficar mais velho eu serei mais forte / Eles me chamarão de
Liberdade, assim como uma bandeira ao vento) – E tal como a própria África,
o povo africano fala em uníssono, mesmo que metaforicamente, que serão mais
fortes, que serão livres, que hastearão as bandeiras de seus países e verão com
orgulho elas balançando ao vento, em tempos de paz e calmaria.
“So many wars, settling scores” (Tantas guerras, estabelecendo pontos) –
Outra ferida na história africana: as guerras em seus territórios. Não apenas
guerras internas, de ditadores, rebeldes etc., mas também de outros países. Um
lugar que já foi dominado por ingleses, franceses, portugueses, alemães, e
muitos outros países não-africanos. A África já presenciou em seu interior
inúmeros tiros, bombas e sangue derramado. Impérios somando locais estratégicos
como se não houvesse qualquer população naquele lugar.
“Bringing us promises, leaving us
poor” (Trazendo-nos promessas, nos
deixando pobres) – Assim fizeram os europeus: invadiram, encontraram minas
e mais minas de minérios, prometeram que a África prosperaria e usurparam tudo.
Um território tão rico, e um povo tão pobre. Essa é a situação na qual os
colonizadores colocaram o continente.
“I heard them say 'love is the way'
/ 'Love is the answer,' that's what they say” (Eu ouvi eles dizerem: “o amor é o caminho” / “O amor é a resposta”, é o
que eles dizem) – A ideia de que o amor era o caminho para a paz e a
felicidade entrava em contradição perante as ações dos homens que garantiram
prosperidade aos africanos e só causaram guerras, pobreza, e ódio.
“But look how they treat us, make us
believers / We fight their battles, then they deceive us” (Mas veja como eles nos tratam, nos fazem acreditar / Nós lutamos em
suas batalhas, e então eles nos decepcionam) – Assim faz o mundo: clama por
amor à África, garante um futuro livre, mas veja como o mundo trata os africanos.
Eles estão fadados, pelo menos por agora, a viver num continete esquecido,
abandonado pelo restante do planeta.
“Try to control us, they couldn't
hold us / 'Cause we just move forward like Buffalo Soldiers” (Tentam nos controlar, mas não podem nos
segurar / Pois nós seguimos em frente, como Buffalo Soldiers) – K’naan faz
uma referência à música de Bob Marley, Buffalo
Soldier, que fala sobre um africano roubado de sua terra e levado à
América, lutando para sobreviver. E assim segue o povo do continente esquecido,
lutando pela vida, e vivendo em uma grande luta. Ainda assim, não há como
controlar um espírito livre, um espírito que clama pela liberdade de seu corpo,
de sua vida.
"Sonho com o dia em que todos levantar-se-ão e compreenderão que foram
feitos para viverem como irmãos.”¹